1. Sabemos o que comemos ou estamos cada vez mais confusos devido ao excesso de informação? Quem, na sua opinião, deve ditar as “regras” do que devemos ou não consumir?
Desde o último inquérito alimentar nacional, cada vez sabemos mais e melhor o que os portugueses comem. A questão é se compreendemos mais e melhor o impacto do que aquilo que comemos tem na nossa saúde. E aqui, devemos considerar que as ciências da nutrição são relativamente recentes, apesar da exuberância da investigação nos últimos anos. Além disso, e mais importante, é uma área em que estudar os efeitos de nutrimentos ou alimentos é extraordinariamente difícil.
É paradoxal que nesta era de tanta informação as pessoas se sintam desorientadas. Neste contexto, é fundamental que as pessoas prefiram fontes de informação credíveis, como universidades, instituições de saúde, centros de investigação, etc. Também há muitos bons profissionais que emitem recomendações muito acertadas e assertivas sobre os mais diversos tópicos em fóruns mais consultados pela população em geral (redes sociais). A questão é que neste meio também há muito mais “lixo” científico e torna-se mais difícil para um leigo na matéria distinguir o que é credível do que não é.
2. Numa entrevista sua, afirmou que “A nutrição não é “binária”, nem matemática. É necessário tempo para se chegar a conclusões”. Como se cruza esta ideia com a rapidez com que se criam os mitos na alimentação?
É, como referi, muito difícil determinar – e sobretudo isolar – o impacto de nutrimentos ou alimentos na saúde. Isto justifica-se, entre outros, por ser complicado fazer investigações “cegas” para investigadores e pacientes com alimentos, pela variabilidade biológica de alimentos e genética dos indivíduos, e pelo tempo de estudo necessário para a ligação entre determinado alimento ou nutrimento e a ocorrência de algumas patologias, por exemplo. Acresce que os resultados não são, frequentemente, “preto ou branco”, mas cinzentos mais ou menos matizados. A solução passa por acumular estudos até se poder fazer uma leitura global (as chamadas meta-análises), que diminuem o erro de interpretação.
Para isto, como se percebe, é necessário mais tempo do que a voracidade por notícias reclama. Esta é uma das razões das informações aparentemente contraditórias entre profissionais de saúde: uns são mais cautelosos e aguardam a solidificação da prova científica, ao passo que outros não resistem à tentação de serem os primeiros a darem respostas, ainda que suficientemente infundadas.
3. Do seu ponto de vista, enquanto nutricionista, selecione os 3 mitos mais “flagrantes” na alimentação em Portugal?
É difícil nomear apenas 3, pois há muitos candidatos. Mas escolho a dieta do pH, a dieta detox e a dieta do paleolítico.
4. Quais os principais desafios da alimentação nos próximos 10 anos?
Garantir alimentação para uma população mundial crescente sem o menor impacto possível no ambiente, continuar a combater os mitos alimentares e atenuar a guerrilha e o entrincheiramento de sub-grupos extremistas de alguns tipos de alimentação.