15.4 C
Lisboa
27 de Abril, 2024
Fito-Notícias

Maria do Céu Antunes: “É fundamental potenciar o crescimento da atividade agrícola”

Foto de Bruno Colaço

Maria do Céu Antunes e Pedro Barreto falam dos desafios da agricultura portuguesa, do impacto da crise inflacionista, da necessidade de desburocratizar o acesso a fundos comunitários e a financiamento para garantir mais e melhor agricultura em Portugal.

Na última década, Portugal teve a quarta maior taxa de crescimento do valor da produção agrícola da União Europeia. O impacto do setor agroalimentar – que inclui agricultura, pescas, indústria alimentar e bebidas – tem sido relevante no comércio externo. Por outro lado, o crescimento médio das exportações situa-se nos 5,5% enquanto as importações crescem a um ritmo inferior, de 3% ao ano, o que se traduz numa melhoria do saldo da balança comercial. O valor acrescentado bruto cresceu mais de 2% ao ano, atingindo 4,2% do PIB em 2021. Maria do Céu Antunes, ministra da Agricultura e da Alimentação, e Pedro Barreto, administrador do BPI, são os primeiros convidados de Agricultura Agora | Conversas sobre Sustentabilidade, um videocast que dá voz a especialistas da área da agricultura numa vertente relacionada com a sustentabilidade nas áreas ambiental, social e financeira.

As entrevistas realizadas no Agricultura Agora | Conversas sobre Sustentabilidade, são conduzidas pelo jornalista João Ferreira e estão integradas com o Prémio Nacional de Agricultura (PNA), que esta semana apresentou a 11.ª edição. O objetivo desta iniciativa do BPI e da Cofina é premiar os agricultores e as empresas portuguesas que se destacam como casos de sucesso no setor da agricultura em Portugal. A missão do PNA é dar voz e visibilidade à agricultura em Portugal, reconhecendo o que de melhor se faz no setor e que conta ainda com o patrocínio do Ministério da Agricultura e o apoio da PriceWaterhouseCoopers.

A agricultura portuguesa está em boas condições e recomenda-se?

Maria do Céu Antunes: Estamos a passar por um momento extraordinário que decorre de uma conjuntura pós-covid-19, da crise inflacionista causada pela guerra e de nove meses de seca severa. Se a última década foi tão positiva, tanto no aumento das exportações como das importações, assim como do Valor Acrescentado Bruto (VAB), a agricultura portuguesa demonstrou que está preparada para o futuro. Segundo dados do Instituto Nacional de Estatística (INE), as exportações agrícolas até outubro 2022, comparadas com o período homólogo em 2021, aumentaram em 30% e as importações em 32%. No entanto, o VAB é determinante, e se em 2021 houve um aumento de 11%, em 2022 verificou-se uma diminuição expectável de 10%. Estes valores justificam-se porque, apesar de na produção agrícola haver um aumento de 7%, os custos de produção também refletem um aumento de 18%. O Governo tem estado a criar mecanismos que mitiguem os efeitos da pandemia, da guerra, da seca e da inflação. Os dados do INE refletem ainda um aumento de cerca de 2,6% dos subsídios à produção. Os agricultores recebem anualmente mil milhões de euros de apoio para garantir alguma estabilidade e fazer face a situações não expectáveis, mas não é o suficiente para momentos tão excecionais como os que temos atravessado. E para momentos excecionais criam-se oportunidades excecionais. O conjunto de medidas que temos implementado contempla a injeção de mais 3 mil milhões de euros no setor energético para tentar mitigar a escalada dos preços, apoios ao gasóleo usado na agricultura, a utilização da reserva de crise da União Europeia (UE) e ainda a utilização dos fundos de desenvolvimento rural. O objetivo é dotar a agricultura portuguesa de instrumentos robustos que permitam mitigar o efeito desta tripla crise e dar continuidade ao seu crescimento. Apesar de hoje termos uma agricultura mais competitiva e preparada para o mercado, continua a haver alguma desigualdade no acesso ao conhecimento e na distribuição dos apoios. Por um lado, queremos continuar a criar medidas para estimular as exportações, por outro esbater estas desigualdades, pensando sempre na nossa pegada carbónica.

A subida dos preços dos fatores de produção, como os fertilizantes, a energia ou a água, afeta muito a agricultura e a economia de uma forma transversal. Neste momento é um dos seus principais desafios?

Pedro Barreto: O clima, e em particular a água, é um dos temas fundamentais para a agricultura, mas existem outros, como é o caso da mão de obra. Todos estes fatores são grandes desafios, mas com a evolução a que assistimos no setor nos últimos 10 anos, estou otimista em relação à nossa capacidade de resolução. No entanto, Portugal tem de ser mais expedito em saber aproveitar a oportunidade dos fundos europeus. Temos até 2029 para aproveitar os fundos que sobraram do Portugal 2020, que com os do Portugal 2030 e do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR), somam um total de 50 mil milhões. Para além disso, penso que a desburocratização também deve ser uma prioridade.

O que está a ser feito para promover esta aceleração e aproveitamento máximo dos fundos?

Maria do Céu Antunes: É preciso simplificar a vida dos agricultores, técnicos e colaboradores e ter mecanismos mais expeditos que deem resposta ao que são as expectativas de quem investe e do próprio cidadão.

No âmbito do PRR, temos um projeto em curso, que envolve cerca de 14 milhões de euros, para reestruturarmos toda a relação com o nosso cliente, nomeadamente o agricultor. Acedendo a um portal online, ele pode submeter candidaturas, pedidos de pagamento e inclusivamente dar dados que nos permitam ajustar a política pública a qualquer momento. Atualmente, o desempenho da atividade agrícola e do complexo agroalimentar e pescas tem um resultado muito positivo. O vinho, por exemplo, está neste momento a atingir os mil milhões de euros de exportações anuais, e o setor da produção de hortícolas e frutos, que há 10 anos exportava 700 milhões de euros, neste momento ultrapassa os 1.700 milhões de euros. É fundamental potenciar este crescimento.

Nestes 10 anos, o Prémio Nacional da Agricultura teve cerca de 9 mil candidaturas e 150 prémios atribuídos. Em 2021, bateu-se o recorde com 1.321 candidaturas. Qual a importância deste prémio?

Pedro Barreto: O objetivo dos prémios é realçar e dar a conhecer aquilo que melhor se faz em Portugal. O que me tem surpreendido de ano para ano não é tanto o número de candidatos, mas a qualidade das candidaturas.

Maria do Céu Antunes: Na agricultura portuguesa temos excelentes exemplos de boas práticas, do ponto de vista ambiental, tal como o uso eficiente da água, o aproveitamento do solo e o bem-estar animal e na garantia das condições de produção, tendo sempre em atenção a sustentabilidade, a mitigação das alterações climáticas e uma adaptação das nossas formas de produzir. Temos consciência de que precisamos de produzir mais com menos. Se, por um lado, a vertente económica está muito patente na dimensão das exportações e do VAB, a dimensão social também é fundamental. A reforma da Política Agrícola Comum (PAC) tem pela primeira vez um condicionalismo social, ao ajudar a corrigir e denunciar situações que estejam menos bem. Estes prémios refletem claramente a dimensão ambiental, social e económica e mostram como os nossos agricultores estão a agir para fazer face a este modelo.

O BPI é reconhecido como o banco para a agricultura. De que forma é que oferece apoio aos seus clientes em prol da agricultura?

Pedro Barreto: Temos uma oferta muito completa para o setor da agricultura. Há cinco anos que temos equipas especializadas na análise de projetos agrícolas. O grande desafio dos bancos é serem relevantes para os clientes e isso obriga a uma segmentação e uma especialização dos serviços oferecidos. É esta a estratégia que temos seguido e a agricultura é uma área claramente prioritária.

A agricultura portuguesa precisa de mais jovens?

Maria do Céu Antunes: Claramente. Atualmente, à semelhança do que acontece nos restantes Estados-membros da UE, a média etária é superior a 65 anos e precisamos de um rejuvenescimento. É importante utilizar estes exemplos de boas práticas, em termos de inovação e desenvolvimento tecnológico, para mostrarmos aos jovens que vale a pena investir na agricultura. Vamos implementar, a partir do início de 2023, medidas muito específicas para este segmento. Ao nível do investimento aumentámos a taxa média de apoio em cerca de 23%, podendo alcançar um máximo de 80% a fundo perdido. Ao nível do prémio à instalação, podemos aumentar até 75%, dependendo das especificidades dos casos. Esta reforma da PAC é a mais ambiciosa dos últimos 30 anos porque, sem perder o foco de que é necessário garantir o rendimento aos agricultores e a viabilidade das explorações agrícolas, olha também de forma muito concreta para a justiça na distribuição desses apoios e para a dimensão das explorações. Apesar de criar condições para potenciar uma agricultura de mercado, mais virada para as exportações, não deixa de lado uma pequena agricultura, muito vocacionada para o comércio de proximidade e que é essencial para alimentar aquilo que é o desenvolvimento económico, social e ambiental de alguns territórios, nomeadamente no interior do país. Temos de o fazer aproveitando as oportunidades que esta transição ecológica e a digitalização trazem para o setor da agricultura. Temos uma agricultura mais tecnológica, assente em mecanismos de precisão, onde claramente os jovens têm uma apetência natural. Desde a utilização de drones, tratores comandados, técnicas de análise de solo, dados de satélite, etc. Todas estas inovações tornam a agricultura mais competitiva independentemente da escala, e mais preparada para os desafios da sociedade.

Notícia publicada no Jornal de Negócios.

Posts relacionados

Roadshow Smart Farm Virtual leva debate sobre ferramentas para sistemas de produção sustentáveis até ao Algarve

ANIPLA

Agricultura, ambiente e as efervescências sem sentido

ANIPLA

Governo anuncia apoio de 2 milhões para prevenir propagação da bactéria Xylella fastidiosa.

ANIPLA

Deixe um comentário



Utilizamos cookies para melhorar a experiência do utilizador, personalizar conteúdo e anúncios, fornecer funcionalidades de redes sociais e analisar tráfego nos websites. Partilhamos informações com os nossos parceiros de redes sociais, de publicidade e de análise, que as podem combinar com outras informações que lhes forneceu ou recolhidas por estes a partir da utilização daqueles serviços. Consente? Mais informações sobre cookies e processamento dos seus dados pessoais, consulte a nossa Politica de Privacidade.

Aceitar Ler mais