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29 de Abril, 2024
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A Agricultura Biológica: Mitos e Realidade – Opinião de Francisco Avillez

1. Introdução

Os defensores da Agricultura Biológica em Portugal têm fundamentado, no essencial, os seus argumentos na promoção de dois mitos e na ocultação de uma realidade.

Um dos mitos é de que não existirão sistemas de produção agrícola sustentáveis para além dos baseados nas práticas exigidas pelo modo de produção biológico.

O outro mito é o de que uma dieta alimentar saudável e acessível a todos, terá que basear-se, necessariamente, em produtos obtidos, apenas, com base em substâncias e processos biológicos.

A realidade ignorada é a de que, apesar de todos os apoios públicos em vigor nestas últimas décadas, as áreas em modo biológico e a respectiva oferta nacional de bens alimentares têm uma expressão reduzidíssima.

Face ao objectivo dos 25% da SAU da UE em modo de produção biológico até 2050, que consta da Estratégia do Prado ao Prato, julgo ser oportuno fazer algumas reflexões sobre estas temáticas, procurando para o efeito responder às três questões seguintes:

  • Será que o Modo de Produção Biológico (MPB) corresponde ao único tipo de sistemas de produção agrícola sustentáveis?
  • Será que a promoção à escala mundial de dietas alimentares saudáveis e acessíveis a todos, poderá vir a ser principalmente baseada em produtos de Agricultura Biológica?
  • Será que a meta dos 25% da SAU, preconizada no contexto da Estratégia do Prado ao Prato, é realista face à realidade produtiva da agricultura portuguesa, em geral, e do seu modo de produção biológico, em particular?

2. Será que o MPB é o único tipo de sistema agrícola sustentável?

De acordo com a FAO, são três os princípios em que se deverão basear os sistemas de produção agrícola sustentáveis.

Primeiro, na obtenção, em simultâneo, de ganhos de produtividade e de uma melhor valorização do capital natural e dos serviços ecossistémicos agrícolas.

Segundo, em melhorias significativas de eficiência no uso dos factores terra, água, energia e agroquímicos.

Terceiro, na utilização da biodiversidade natural na procura de formas mais resilientes aos factores de riscos abióticos e bióticos.

Segundo a FAO, as práticas agrícolas capazes de assegurar a implementação com sucesso destes três princípios, podendo diferir de acordo com as condições e necessidades específicas locais, deverão basear-se nos seguintes aspectos comuns:

  • numa mobilização mínima dos solos de forma a contribuir para o aumento da sua matéria orgânica e da sua estrutura;
  • numa protecção eficaz da superfície da terra arável, de modo a evitar a erosão, a conservar a água e os nutrientes, a promover a actividade biológica do solo e a contribuir para uma gestão integrada do combate às doenças das plantas;
  • no recurso a associações, sequências e rotações de culturas melhor adequadas à melhoria do fundo de fertilidade dos solos e à resiliência dos factores de risco;
  • no uso das variedades de elevada produtividade bem adaptadas aos diferentes tipos de solos;
  • no recurso a um uso equilibrado de fertilizantes orgânicos e inorgânicos e a rotações de culturas melhoradoras da qualidade dos solos;
  • numa gestão integrada das infestantes e doenças das plantas, com base em práticas agronómicas apropriadas, na biodiversidade natural e no uso selectivo de fitofármacos de baixo risco;
  • num uso eficiente da água através do recurso a práticas agronómicas potenciadoras da capacidade de utilização de água pelos solos e a tecnologias de precisão.

Trata-se, portanto, de um conjunto de práticas que não exigirão, como o faz o MPB, a não utilização de agro-químicos para que se possa assegurar a sustentabilidade dos respectivos sistemas de produção. Pode-se, assim, afirmar que existe produção agrícola sustentável para além da alcançável pela agricultura biológica, cuja sustentabilidade em Portugal não temos, aliás, a possibilidade de confirmar, uma vez que não existem estudos credíveis, apesar da enorme quantidade de análises de solos que as condições de elegibilidade do MPB têm exigido aos produtores nestas últimas décadas.

3. Será que só os produtos biológicos é que permitem a promoção de dietas saudáveis e acessíveis a todos?

Um dos principais desafios com que a Humanidade será confrontada nas próximas décadas irá ser o de satisfazer as necessidades alimentares de mais de 10 mil milhões de pessoas com base em dietas saudáveis e acessíveis a todos, baseadas em sistemas alimentares sustentáveis.

As projecções das instituições internacionais apontam para que até 2050, a população mundial irá ser não só mais numerosa, como também mais envelhecida e urbanizadas e com níveis médios de rendimento mais elevados. Tal evolução irá ter necessariamente um impacto muito significativo nos padrões de consumo futuros e, consequentemente, nos sistemas de produção agrícolas e alimentares.

(…)

Tudo o que acabo de afirmar, não põe em causa o papel positivo que sempre caberá à agricultura biológica e que, espero, possa vir a ser reforçado no futuro. O que não é admissível, é que este reforço seja feito à custa de uma “diabolização” de outras formas de produção sustentável indispensáveis para assegurar, à escala mundial, uma alimentação saudável e acessível a todos.

Francisco Avillez

Professor Catedrático Emérito do ISA, UL e Coordenador Científico da AGRO.GES

Lei-a a notícia completa In: Agroportal

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