© Leonardo Negrão/Global Imagens
Nos últimos cinco anos, a indústria produtora de fitofármacos, vulgarmente conhecidos como pesticidas, investiu um milhão de euros em formação, tendo envolvido 66 mil agricultores e técnicos, de acordo com a Associação Nacional da Indústria para a Proteção das Plantas (ANIPLA).
Se tivermos em conta o último censo agrícola do Instituto Nacional de Estatística, havia cerca de 314 mil agricultores em Portugal, em 2019. Por aproximação, pode estimar-se que 20% receberam este tipo de formação, mas não tem diretamente a ver com os cursos exigidos por lei para a atribuição de licenças a quem quer comprar, aplicar ou transportar determinados químicos usados na agricultura.
Parte do esforço para tornar os fitofármacos (onde se incluem fungicidas, herbicidas e inseticidas, por exemplo) mais compatíveis com as boas práticas agrícolas – para proteção da saúde e preservação do ambiente – é apontado pela Anipla como sinal do seu compromisso para com o Pacto Ecológico Europeu, com o qual os órgãos sociais recém-eleitos da associação terão de lidar ao longo do novo mandato.
O contexto é adverso para este tipo de indústria, tendo em conta que as metas europeias preveem o corte de 50% no uso de pesticidas nos próximos oito anos, embora seja uma ambição que a presidente da Anipla, Felisbela Torres Campos – reconduzida no cargo, diz apoiar.
“[A Anipla] está comprometida com o desenvolvimento de tecnologias agrícolas sustentáveis, comprometendo-se a desempenhar o seu papel na inovação, apoiando os agricultores e a produção de alimentos.”
No entanto, ao Dinheiro Vivo, a dirigente sublinha que as metas europeias remetem a indústria “para a necessidade de explorar e debater as diferentes exigências fitossanitárias de cada país”. Isto porque, “as práticas agrícolas, as ferramentas e as carências inerentes a cada cultura e o tipo de clima em cada país ou região ditam a necessidade de adaptar essas mesmas metas”.
Por outras palavras, Felisbela Torres Campos situa o caso de Portugal como um dos países da orla do Mediterrâneo mais expostos às consequências das alterações climáticas, o que, em sua opinião, o torna suscetível “ao aparecimento de novas doenças, pragas e infestantes” para as culturas. Por esse motivo, entende que toda essa exposição “pressupõe diferentes soluções que assegurem a sustentabilidade da agricultura portuguesa”. Daí considerar que está disponível para “discutir metas realistas, baseadas na ciência e adaptadas às diferentes realidades”.
Dependência total do exterior
A indústria de fitofármacos em Portugal é constituída maioritariamente por filiais de multinacionais. Na Anipla, por exemplo, apenas um associado tem fábrica em Portugal, no entanto, no seu conjunto, representam 95% do mercado, asseguram 700 empregos e faturaram cerca de 170 milhões de euros em 2021.
Mas há aqui uma especificidade que Felisbela Torres Campos assinala: “A dependência do exterior é total, quer relativamente a produtos acabados quer relativamente a matérias-primas. Os poucos que são fabricados em Portugal dependem também de matérias-primas e outros componentes de origem externa”.
Apesar dessa dependência do exterior, a dirigente associativa ressalva que, com a pandemia e agora com da guerra na Ucrânia, “a indústria tem sido capaz de manter o fornecimento regular de produtos fitofarmacêuticos, salvo raríssimas exceções”.
Impacto nos custos e preços
Sendo a principal origem das matérias-primas a Ásia e a Europa, reconhece que a indústria nacional do setor “pode sentir mais dificuldades no abastecimento decorrentes de constrangimentos ao nível do transporte e da logística”, embora “até ao momento” admita que têm “conseguido um nível de abastecimento ao mercado sem grandes sobressaltos”.
Sobre o impacto económico da situação, Felisbela Torres Campos afirma não ter “dados concretos quanto ao aumento dos custos de produção”. Apenas avança: “Sabemos que as componentes (como a escassez de matéria-prima, energia e logística) tiveram os seus impactos no aumento de preços de alguns produtos, sobretudo ao nível dos herbicidas”.
Mas, questionada sobre a quantificação desses aumentos, a dirigente assumiu que, “no caso dos produtos fitofármacos, os aumentos, regra geral, não foram significativos. No entanto, temos conhecimento de (pequenas) exceções em que os preços podem ter duplicado, mas são casos pontuais”.
Sinais dos tempos
À margem dos efeitos que a conjuntura externa possa causar no setor, a Anipla elegeu a inovação, a transformação digital e a sustentabilidade como pilares para enfrentar as mudanças de contexto e as exigências comunitárias.
Nessa linha, Felisbela Torres Campos assinala a evolução que a indústria fitofarmacêutica tem conseguido, apresentando agora “tecnologias inovadoras e complementares em vários âmbitos, como a biotecnologia, os biopesticidas e as ferramentas de precisão”, para responder às necessidades dos agricultores para “combater pragas, doenças e infestantes”, mas “sem descurar o ambiente e a saúde”.
Lembra que, só em biopesticidas, a indústria europeia do setor tem o compromisso de investir mais de quatro mil milhões de euros em inovação até 2030.
Sublinha ainda que são “soluções cada vez mais adaptadas, do ponto de vista da segurança e da eficácia”, com a salvaguarda adicional de que “os agricultores são hoje mais formados e informados do que eram”.
Notícia original publicada no Dinheiro Vivo